Há uns anos, quando comecei a integrar o mercado de trabalho, não me passava pela cabeça ter de sair do país para ganhar a vida. As histórias de emigrantes pareciam-me pertencentes à geração anterior à nossa.
Mas parece que a história se repete. Desde a década de 60 que não saía tanta gente de Portugal para trabalhar. Na altura, com a 4ª classe; hoje, com licenciaturas e mestrados que, por aí, dão direito a anos e anos seguidos a recibo verde, ou a concorrer, como sete cães a um osso, a bolsas de 750€ por mês (sem direito a subsídio de almoço, porque bolseiro come sandes...), ou a trabalhar numa loja dum shopping até à meia-noite, por 600€. Isto, enquanto o banco nos leva 500€ por mês, dos quais só 10% abatem o crédito do “pequeno T2” usado nos arredores. Chapa ganha, ginástica financeira, chapa gasta. Vá lá, não vai faltando na mesa. Mas sem luxos. Faz todo o sentido a anedota segundo a qual Portugal é um país essencialmente agrícola: uns já cavaram, outros vão cavar, e os que ficam são nabos. O último a sair apaga a luz do aeroporto.
Pronto, já desabafei. Agora somos emigrantes. Estamos longe da família e dos amigos, dos passeios pela Serra de Sintra, das planícies do Alentejo, dos vales do Douro, das delícias que se comem por lá, das sestas e da ronha no nosso pouf-pêra, da nossa casa...
No que eu fui "falar"!!! A nossa casa!... Snif... Agora "temos" duas, não é? Talvez seja melhor referir-me à de Tercena como “o nosso ninho”. Porque, na verdade, nestes três anos a nossa casa será a da Rua Amílcar Cabral, em Luanda.
Vamos conhecendo outras gentes, outras praias, outros montes e vales. Tentamos não pensar na saudade, mas ela às vezes bate. Confesso que o stress provocado pela sobrecarga de trabalho até me ajudou um pouco a distrair. E, para o tempo passar mais ou menos depressa, temos de o ir medindo em 4 meses de cada vez, ou semana-a-semana, ou dia-a-dia. Estamos a pensar como o típico imigrante que na década de 60 foi para «Paris de França», Suíça ou Luxemburgo, e anseia pela chegada das “vacanças”.
Pela primeira vez desde que aqui chegámos, estamos a fazer a mala para o regresso a casa. A primeira mala é especial, e não é apenas pela carga simbólica: na ida a casa vai com pouca roupa e artesanato QB; no regresso a Angola trará os luxos que nos pediram para trazer (um perfume Kenzo para o Xavier deixar a sua "dama" maluca, um compasso para a futura arquitecta Lúcia, uma máquina fotográfica para a Helena) e... especiarias! Sim, especiarias. Pôrra, não é por ganharmos mais do que os 750€ de Portugal que vamos gastar 4€ num frasco de cebolinho!
Daqui por 24 horas, se não houver atrasos, estaremos num avião da TAP a iniciar a marcha em direcção à Portela. Não prometemos ir devagar.