quarta-feira, 15 de outubro de 2008

Tirar a barriga de misérias


Quando criei este blog, o objectivo foi escrever sobre Angola, contar curiosidades de cá. Bem, este deverá ser dos posts que menos têm a ver com este país. Vou chamar-lhe pomposamente uma descrição pelo inverso.

«Atão?!», perguntam vocês, pelo menos os que não falam correctamente... :P

“Atão”, falemos de tudo o que é de díficil acesso em Angola e que, por isso, ganha uma importância especial em Portugal.

À semelhança do que tinha acontecido com as gerentes da empresa (e acredito que aconteça o mesmo com grande parte dos portugueses no estrangeiro), as férias em Portugal não foram abundantes em descanso. A preferência pela assistência médica lusa, juntamente com a catadupa de assuntos que foi necessário resolver, obrigou a uma certa correria.

No nosso caso, parte da correria foi em cenário de passeio, porque tinhamos a necessidade de descansar as vistas. Como sabem, para nós a melhor maneira de encarar Luanda é levando o dia-a-dia na brincadeira, para não repararmos que 80% da população mora em bairros sem condições, por onde serpenteia uma água verde, castanha, ou até cinzenta, que inunda as redondezas de um constante cheiro a fossa. Mas sair daqui para contemplar os dormitórios da Área Metropolitana de Lisboa também não seria grande programa. Daí, termos tido a ideia de limpar o pó dos olhos com o verde e o azul de um arquipélago como os Açores. Claro que o tempo não chegou para ver tudo o que queriamos e, no fim, perguntávamo-nos como é que, depois de passearmos por Angra do Heroísmo ou de vermos a Lagoa de Santiago, iamos conseguir voltar a encarar o Bairro do Prenda.

Da minha parte, bastou ter perdido quase duas horas em sentidos proibídos na zona do Saldanha para relativizar as contrariedades. E, quando ambos levámos uma tareia das ventanias de fim de tarde (a Paula, com cartões na mão, ia levantando voo), lembrámo-nos que talvez seja mais fácil passar estes dois meses e meio até ao regresso se formos acompanhando o estado do tempo aí no rectângulo. Cada vez que virmos aí um dia cinzento, chuvoso e frio, vamos agradecer os trinta e tal graus que o sol nos reserva para os próximos tempos no hemisfério sul. Ou então não.

Ora, para fazer jus ao título deste post, não podia deixar de referir as várias vezes em que cometemos o pecado da gula. Aqui o menino tinha perdido 1 quilo por mês, e impunha-se a implementação do “processo de engorda do porco”. Se até a popular moela caseira foi apreciada como um manjar, que dizer da sofisticação de pastéis de massa tenra recheados com queijo chévre e cobertos de geleia e nozes; ou de sushi, caranguejo, gengibre e sake? Ou, nos Açores, de espadarte assado na pedra ou bife de tubarão? Para os próximos meses, fica a promessa de dar a devida atenção às refeições. Pelo menos, quais navegadores dos Descobrimentos, já trouxémos na bagagem um valente carregamento de especiarias, com o alto patrocínio do Supermercado Mirapreço do nosso amigo João.



Se houvesse alguma dúvida que a avalancha de trabalho me tinha anestesiado parcialmente das saudades que tinha, bastou chegar a casa para ter a certeza. A sensação de, em 4 meses e meio, termo-nos esquecido do lugar de alguns utensílios de cozinha, foi estranha. Tal como, ao aproximar-se o fim das férias, começar a pensar nas bugigangas que vão no contentor para rechear a casa que, relembro, será a nossa durante 3 anos. Não deixa de ser curioso que os símbolos da nossa confiança na estabilidade deste “projecto de vida” sejam uma máquina de café e um aspirador (varrer um 1º andar de 150 m2 na empoeirada cidade de Luanda custa “um bocadinho” mais que aspirar um 3º andar de 70 m2 nos arredores de Lx). Mas não se enganem: no fim desses 3 anos eles ficam cá, nós não.

6 comentários:

Anónimo disse...

Vais ter especiarias para três anos! :)))

Beijinhos
tia mica

Lopesco disse...

Errr....

"Mirapreço" e não "Mira Preço"...

:D

Abreijos!

Anónimo disse...

Sempre quero ver o uso que esse aspirador vai ter...

Anónimo disse...

Compreendo-te. Já está decidida a não permanência ao fim dos 3 anos?

RAD disse...

@Tia: Ao ritmo a que a Paula as usa, não sei não. ;)

@Lopes: Corrigido. ;)

@Afonso: Sempre que quiseres, está à tua disposição...

@Anónimo: O plano é por três anos. Há quem venha trabalhar para Angola a termo certo, acabe por mudar de ideias e fique uma vida inteira. Por motivos familiares, pelo menos para já não nos parece que mudemos de ideias; o plano continua a ser cumprir o compromisso que assumimos.

Anónimo disse...

...a perder um Kilo por dia?? Ainda existes...no sentido físico??

Caríssimo, foi com base na troca de especiarias que os portugueses dominaram metade do mundo!!!

André.