sexta-feira, 12 de setembro de 2008

«Vem devagar, emigrante»


Há uns anos, quando comecei a integrar o mercado de trabalho, não me passava pela cabeça ter de sair do país para ganhar a vida. As histórias de emigrantes pareciam-me pertencentes à geração anterior à nossa.

Mas parece que a história se repete. Desde a década de 60 que não saía tanta gente de Portugal para trabalhar. Na altura, com a 4ª classe; hoje, com licenciaturas e mestrados que, por aí, dão direito a anos e anos seguidos a recibo verde, ou a concorrer, como sete cães a um osso, a bolsas de 750€ por mês (sem direito a subsídio de almoço, porque bolseiro come sandes...), ou a trabalhar numa loja dum shopping até à meia-noite, por 600€. Isto, enquanto o banco nos leva 500€ por mês, dos quais só 10% abatem o crédito do “pequeno T2” usado nos arredores. Chapa ganha, ginástica financeira, chapa gasta. Vá lá, não vai faltando na mesa. Mas sem luxos. Faz todo o sentido a anedota segundo a qual Portugal é um país essencialmente agrícola: uns já cavaram, outros vão cavar, e os que ficam são nabos. O último a sair apaga a luz do aeroporto.

Pronto, já desabafei. Agora somos emigrantes. Estamos longe da família e dos amigos, dos passeios pela Serra de Sintra, das planícies do Alentejo, dos vales do Douro, das delícias que se comem por lá, das sestas e da ronha no nosso pouf-pêra, da nossa casa...

No que eu fui "falar"!!! A nossa casa!... Snif... Agora "temos" duas, não é? Talvez seja melhor referir-me à de Tercena como “o nosso ninho”. Porque, na verdade, nestes três anos a nossa casa será a da Rua Amílcar Cabral, em Luanda.

Vamos conhecendo outras gentes, outras praias, outros montes e vales. Tentamos não pensar na saudade, mas ela às vezes bate. Confesso que o stress provocado pela sobrecarga de trabalho até me ajudou um pouco a distrair. E, para o tempo passar mais ou menos depressa, temos de o ir medindo em 4 meses de cada vez, ou semana-a-semana, ou dia-a-dia. Estamos a pensar como o típico imigrante que na década de 60 foi para «Paris de França», Suíça ou Luxemburgo, e anseia pela chegada das “vacanças”.

Pela primeira vez desde que aqui chegámos, estamos a fazer a mala para o regresso a casa. A primeira mala é especial, e não é apenas pela carga simbólica: na ida a casa vai com pouca roupa e artesanato QB; no regresso a Angola trará os luxos que nos pediram para trazer (um perfume Kenzo para o Xavier deixar a sua "dama" maluca, um compasso para a futura arquitecta Lúcia, uma máquina fotográfica para a Helena) e... especiarias! Sim, especiarias. Pôrra, não é por ganharmos mais do que os 750€ de Portugal que vamos gastar 4€ num frasco de cebolinho!

Daqui por 24 horas, se não houver atrasos, estaremos num avião da TAP a iniciar a marcha em direcção à Portela. Não prometemos ir devagar.

9 comentários:

Carlos Alberto Jr. disse...

Companheiro,
Não sou tuga. Sou pula. Também vou sábado ao Brasil. Talvez nos encontremos no aeroporto. Durmo em Lisboa e sigo no domingo para Brasília. Será que nos veremos?
Dê sinais para o diariodaafrica@gmail.com

RAD disse...

Se amanhã entre as 7 e as 9 vir um tipo alto e magro, com 30 anos e cabelo grisalho, sou eu. ;)
Enviei mail.

Anónimo disse...

Boa viagem e boas férias!
Bjs
Tia Mica

Anónimo disse...

So' posso dizer que ser emigrante em Angola, na Europa, ou no outro lado do mundo, e' igual.

Ja' estive ai', agora estou aqui, mas estou sempre longe de "casa".

Somos emigrantes a partir do momento em que nos despedimos dos nossos.

Precários Inflexíveis disse...

citámos este post aqui:
http://precariosinflexiveis.blogspot.com/2008/09/missiva-ao-ministrio-da-emigrao.html

André disse...

Quando arranquei para Angola a primeira vez e me despedi, por 3 meses, o meu tio disse-me: "não é mau, na minha altura despediamo-nos por, pelo menos, um ano!".

José Jorge Frade disse...

Saudações de um blogueiro amigo de Angola.

Zé kahango
http://bimbe.blogs.sapo.pt

Anónimo disse...

Entre Tercena e Luanda eu tambem escolheria Luanda.

RAD disse...

Caro Anónimo,

Não sei bem como interpretar o seu comentário. Não sei se já esteve em Angola, e em que condições. Mas, seja como for, há demasiados aspectos (condições de vida, família, carreira) em jogo para se poder afirmar taxativamente que se escolhe um país ou o outro.