segunda-feira, 1 de junho de 2009

Não há dinheiro, não há palhaços


Ao longo de um ano, já perdemos a conta às vezes que ouvimos apregoar que Angola é um país rico, porque tem petróleo e diamantes. Será que neste momento o é?

Quase 3/5 do Produto Interno Bruto angolano assenta nestas indústrias. Mais precisamente 58% no petróleo e 1.5% nos diamantes. Isto é: os melhores amigos das raparigas são um chão que já deu uvas. Acabaram. Period.

Já o petróleo... tem aquela coisa chata das cotações variáveis. O ano passado chegou a roçar os 150 USD por barril, e o PIB cresceu uns impressionantes 16% relativamente ao exercício anterior. À boa maneira mwangolé, fizeram-se previsões optimistas, nas quais o Orçamento de Estado para 2009 se baseava. Azar do caraças, o preço do barril de crude desceu até pouco mais de um terço daquele valor recorde, e não parece estar a recuperar com grande agilidade. O FMI estima agora que o “crescimento económico” angolano em 2009 seja de… -3%!

No último mês ocorreu uma sucessão de factos curiosos. Primeiro, uma dança de cadeiras no Banco Nacional de Angola. A seguir, de um dia para o outro o câmbio Dólar – Kwanza variou de 75 para 82, para uma semana depois voltar a 75, e poucos dias mais tarde para 78. Quando estabilizou, reparou-se que à custa de transacções feitas neste período, as reservas do país tinham diminuído em 4 mil milhões de dólares. Com as finanças periclitantes como já não se via há anos, a partir de meados de Maio as transferências para o exterior ficaram limitadas a 5000 USD mensais por conta bancária. Segunda uma fonte ligada ao BIC, este limite já estava previsto por lei desde 1998, mas não era aplicado por laxismo. No Aeroporto, o limite baixou de 15’000 USD para 10’000 USD, com a garantia de revista para toda a gente.

A esta hora, um pouco por toda a Angola, grande parte dos 100’000 portugueses e mais uns quantos brasileiros (isto é, os que recebem cá) estão, com as respectivas entidades patronais, a desenrascar uma forma de contornar este problema. As regras em Angola são assim: são desencantadas de um dia para o outro, atropelam direitos, e logo os prejudicados dão corda aos neurónios à procura de uma forma de não o serem.

Há três desfechos possíveis para este episódio: ou se encontra a tal solução em cima do joelho, ou o BNA e revoga a sua medida ou, numa dúzia de semanas, uma fatia considerável da mão-de-obra qualificada estrangeira antecipará em massa o regresso a casa, pondo em causa a «reconstrução nacional». Como dizia o outro, «não há dinheiro, não há palhaços».

2 comentários:

Nuno Leal disse...

Ò primo, nem tanto à terra, nem tanto ao mar. Há que ter alguma regulação e bom senso, regras de mercado, enfim, coisa que não acontecia aqui, fruto de algum laxismo e facilitismo tão tipicamente angolanos mas (muito bem) apreendidos em 500 anos de vida conjunta com os portugueses...

De facto, isso de implementar leis antigas agora trouxe a muitos expatriados, e não apenas nós portugueses, problemas com que não contavam quando para cá vieram. Mas isso deve-se à crise internacional e, muito mais em particular, à descida do preço do petroleo, que implicou uma diminuição para um terço das receitas mensais arrecadadas, conforme se pode ler nesta entrevista do ministro da economia no Público (ver em http://economia.publico.clix.pt/noticia.aspx?id=1384592).

Há que ter alguma calma e ponderação e pensar de forma ponderada como resolver esse obstáculo agora surgido. Porque sabes bem que nem o Estado Angolano cede a pressões desse género (do tipo "ou se resolve ou vai tudo embora") nem isso é resposta ao problema. Alguma solução irá surgir e é aqui que o nosso (só)cretino Governo português deveria intervir mas, como habitualmente, zero!, de tão preocupado que está com as asneiras do Vital, a participação dos partidos nas manif's dos prof's e o arquivamento do fripor... Quanto a mim a pressão tem de ser feita lá em Portugal e não cá, é o Governo de Portugal que deveria abrir conversações para melhorar os fluxos financeiros e de empregados entre as duas nações, de forma a facilitar quem quer investir cá e levar o retorno do investimento para lá, quem quer vir trabalhar e levar o fruto do seu trabalho para lá e o inverso. Mas sobre isso, só me lembro do Sócrates a correr na marginal de Luanda, foi o facto mais marcante da vinda dele cá...

RAD disse...

Bem, admito que lendo o último parágrafo, transparece a ideia de que defendo um ultimato, mas não era esse o sentido que pretendia transmitir; era, na verdade, um prognóstico.

Dos três desfechos que abordei no post, o cenário mais provável será uma solução encontrada entre trabalhadores e empregadores, que contorne esta limitação (é a tal máxima tantas vezes repetida, de que as regras foram feitas para serem quebradas).. Porém, continuo a acreditar que, neste momento, trabalhar em Angola tornou-se menos atractivo para parte dos que cá estão - pelo menos os que não conseguirem uma alternativa -, e se calhar mais ainda para os que estavam a pensar vir. A revogação deste regulamento não deverá acontecer por pressões, mas por uma melhoria gradual do estado da economia.

Quanto a uma intervenção do Estado português, será igual à que defendeu (not) os portugueses em ’75, e à que defendeu (not) em ’92 os que resistiram a ’75. Mas não é uma questão de rosa, laranja ou azul-e-amarelo, porque todos, da esquerda à direita, estenderam o tapete e prestaram vassalagem ao Zédu quando foi a Portugal há uns meses: uns porque é um grande marxista (...), outros porque muitas empresas portuguesas precisam de negócios em Angola para não fecharem as portas.